PALHAÇO
Auto da
Compadecida! Uma história altamente moral e um apelo à misericórdia.
JOÃO GRILO
Ele diz “à
misericórdia”, porque sabe que, se fôssemos julgados pela justiça, toda a nação
seria condenada.
(SUASSUNA,
Ariano. Auto da Compadecida, pag. 16)
A peça de teatro
Auto da Compadecida, de Ariano
Suassuna, é realmente um espetáculo! A linguagem simples e o tema de moralidade
a torna acessível a todos.
Primeiro assisti
ao filme nacional, lançado em 2000, dirigido por Guel Arraes e estrelado por Matheus Nachtergaele,
Selton Melo e Fernanda Montenegro. Apesar de ter gostado muito, nunca tinha
pensado em ler a obra, até que, por acaso, a encontrei na biblioteca da
faculdade e meu sorriso cresceu imensamente. Não me arrependo de ter tirado
essas poucas horas para ler.
Baseada em
histórias populares do Nordeste, Auto da
Compadecida recebe interferência de um Palhaço que inicia a peça, como se
fosse um narrador oportuno. Esse Palhaço é um personagem que avisa aos
espectadores o que eles podem esperar e também explica sobre a representação do
Encourado (diabo), Nossa Senhora e Nosso Senhor Jesus Cristo (ou Manuel), para
que o público não se assuste. Em dados momentos, o Palhaço intere quanto ao
cenário, dizendo aos atores o que eles devem fazer, o que deu um gostinho de
“improvisado” ao teatro e que gostei muito. É uma peça sem pretensão.
PALHAÇO
Ao escrever esta
peça, onde combate o mundanismo, praga de sua igreja,
o autor quis ser
representado por um palhaço, para indicar que sabe,
mais do que ninguém, que
sua alma é um velho catre, cheio de insensatez
e de solércia. Ele não tinha o
direito de tocar nesse tema, mas ousou fazê-lo,
baseado no espírito popular de
sua gente, porque acredita que esse povo
sofre e tem direito a certas
intimidades.
(SUASSUNA,
Ariano. Auto da Compadecida, pag. 16)
A peça trata-se
das artimanhas de João Grilo que, sentindo-se negligenciado pelo patrão padeiro
e a mulher do mesmo (que deram bife na manteiga para o cachorro e nada para o
próprio João Grilo, numa ocasião em que este estava doente), tenta se vingar
conseguindo mais dinheiro deles. O companheiro de João é Chicó, um homem sem
coragem que conta muitas mentiras, porém inocentemente. A frase “Não sei, só
sei que foi assim” é dele e sempre vem depois de uma história um tanto
improvável como, por exemplo, um peixe pescando um homem. Esses dois
personagens, é possível notar, são pobres e querem apenas sobreviver. No
entanto, eles reconhecem a injustiça que as pessoas praticam e, no caso de
João, isso não pode ficar assim.
Os outros
personagens incluem o Padre, o Sacristão, o Bispo (todos se envolvem na
história de enterrar um cachorro em latim porque ele supostamente deixou um
testamento oferecendo alguns trocados para essas pessoas), o Severino (um
cangaceiro que manda matar quase todos), o outro cangaceiro e a representação
do Encourado (o diabo), o demônio, Manuel (Jesus) e a Compadecida. Os últimos
participam do ato final, do julgamento, numa cena hilária que trata a humanidade,
com suas virtudes e fraquezas.
Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna |
Original ou não,
Auto da Compadecida já se tornou um
clássico do teatro, recebeu adaptação para o cinema e a televisão na forma de minissérie da Globo (em 1999). A cena do julgamento me lembrou a peça de Gil Vicente, Auto da Barca do Inferno, com anjo e
diabo discutindo para onde as pessoas deveriam ir. Aqui a Compadecida
representa a compreensão sobre os humanos, e a chance de absolvê-los.
A COMPADECIDA
(…) É verdade
que eles praticaram atos vergonhosos,
mas é preciso levar em conta a pobre e
triste condição do homem.
A carne implica essas coisas turvas e mesquinhas.
Quase tudo o que eles faziam era por medo. Eu conheço isso,
porque convivi com
os homens: começam com medo, coitados,
e terminam por fazer o que não presta,
quase sem querer. É medo.
(SUASSUNA,
Ariano. Auto da Compadecida, pag.
149)
Escrito por MsBrown
0 comentários:
Postar um comentário
Comente sempre que quiser. Não deixe de sugerir, criticar e elogiar as postagens, se for o caso. Deixe seu endereço para retribuirmos a visita.