Tennessee Williams não tem medo de expor seus pensamentos. Quando se lê suas obras, é possível relacioná-las a fatos de sua vida - suas angústias, a constante procura por compreensão. Isso é o que acontece em À Margem da Vida (The Glass Menagerie), a peça de teatro em que é apresentado Tom Wingfield, um jovem que trabalha num depósito de calçados, mas que quer ser escritor e entrar para a Marinha Mercante.
Tom
(…) Na Espanha houve Guernica!
Mas aqui só havia música de swing hot e uísque, salões de dança,
cinemas e sexo, que pairava na penumbra como um
lustre e inundava
o mundo de arcos-íris breves e ilusórios.…
(WILLIAMS. À Margem da Vida, pag. 69)
As relações familiares são sempre difíceis nas obras de Williams. Neste livro, ambientado na década de 1930, Tom tem problemas com a mãe, Amanda, pois esta sempre está a dizer que ele é egoísta por querer ser escritor e ir embora. Tom é o único em sua casa que trabalha e tem que sustentar a mãe e a irmã, Laura. Mas ele não está feliz. Todos os dias vai ao "cinema" e volta apenas a poucas horas de acordar e ir para o trabalho.
Laura é a irmã, frágil, que tem problemas de saúde. Ela não terminou os estudos, tem grande dificuldade para lidar com as pessoas, é aleijada e tem o complexo de inferioridade. Amanda, que em sua juventude foi encantadora e tinha muitos pretendentes, quer arranjar um marido para Laura, sugerindo que Tom convide um de seus amigos para um jantar. O pai de Tom, que participou da Primeira Guerra Mundial, abandonou a família certo dia, deixando Amanda de coração partido e ela nunca o superou - constantemente compara-o com Tom.
O cavalheiro visitante - convidado de Tom -, chama-se Jim O'Connor e representa a esperança de Amanda e Laura (ela era apaixonada por ele no colégio). Jim tenta convencer Laura de que ela precisa se sentir superior, parar de criar ilusões sobre ser menos importante, mas Jim apresenta ser muito rígido com sua aparência e um tanto alheio à realidade também.
Tom é incompreendido. Quer ser escritor mas tem que trabalhar com calçados para a sobrevivência. Suas idas ao "cinema" podem significar muitas coisas. É certo que ele realmente vai ao cinema, mas passa por outros lugares depois, frequentemente voltando para casa num estado deplorável. Tennessee Williams teve um pai (abusivo) vendedor de calçados que era veterano de guerra; quando criança, teve difteria (doença respiratória infectocontagiosa) e mais tarde problemas com alcoolismo e anfetaminas e barbitúricos, logo após sua irmã Rose ficar incapacitada pela cirurgia de lobotomia, em 1937 - fatos que contribuíram para a feracidade/veracidade de À Margem da Vida, cheia de diálogos honestos e sofridos.
Laura possui uma coleção de animais de vidro, tendo como seu preferido o unicórnio, um grande símbolo para o livro. Tennessee também era apreciador dessa arte e quando criança tinha enfeites de animais de vidro em seu quarto. É possível que Laura tenha sido inspirado pela irmã Rose e Amanda pela própria mãe de Tennessee, sobrando Tom para o papel do autor. Enquanto isso, o pai Wingfield, ausente, poderia representar a falta de fraternidade entre o autor e seu pai.
Tom
Mas sou o contrário de um mágico de teatro.
Ele
lhes dá uma ilusão com aparência de verdade.
Eu lhes dou a verdade sob o
disfarce agradável da ilusão.
(WILLIAMS. À Margem da Vida, pag. 26)
Tennessee Williams escreveu pedaços de sua vida, conferindo a angústia de todos os personagens, uma poética tocante - uma esperança tênue -, na peça que iniciou sua carreira de sucesso, em 1944. À Margem da Vida recebeu o prêmio New York Drama Critics' Circle e foi produzida para o cinema em 1950, dirigido por Irving Rapper e estrelado por Gertrude Lawrence, Kirk Douglas e Jane Wyman. Em 1973, a obra foi filmada para a TV, com a direção de Anthony Harver e estrelando Katherine Hepburn, Sam Waterston e Joanna Miles. Outras adaptações também foram realizadas.
As obras de Tennessee Williams são psicológicas, realistas. Ele é um autor sem medo de se expor, procurando, talvez, através de suas próprias palavras, alguma compreensão, assim como a maioria de seus personagens. Em À Margem da Vida havia uma atmosfera quase fúnebre pelos sonhos não alcançados, e depois a poesia, a visão da esperança, a procura por algo significativo, os símbolos, a visão do passado e presente, através do narrador-personagem Tom Wingfield.
Para ler mais sobre o autor, clique aqui. Para conhecer outra obra, Um Bonde Chamado Desejo, clique aqui.
Escrito por MsBrown
Olá!
ResponderExcluirNão conhecia a obra, acredita? Também não me recordo do autor... vou pesquisar mais sobre ele, inclusive. (: Adorei o texto... super informativo... e você escreve bem. :D Enfim...
Um abraço!
http://universoliterario.blogspot.com.br/
Muito obrigada, Francielle! Esse autor está me surpreendendo mais a cada livro que eu leio dele, são tão íntimos e realistas! Espero que goste.
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